quinta-feira, janeiro 22, 2015

O OURO POPULAR PORTUGUÊS IV

Desde a Antiguidade Clássica que se tornou corrente a utilização de moedas, medalhas ou outra peças como ornamentos, quer em alfinetes como em pingentes de colares ou cordões. Estes ornamentos, mais que o estatuto pessoal do seu utilizador, possuíam uma simbologia própria, associada muitas vezes ao divino ou à crença popular no além.
Muito embora existam ornamentos com representação iconográfica semelhante em épocas anteriores, é a estética do sec.XVIII que influência a joalheria popular do sec.XIX e início do sec.XX e que hoje parece renascer por influência dos “opinion makers” da indústria da moda (e ainda bem!).
É sobre esses ornamentos que vos vamos falar neste quarto artigo desta série dedicada ao Ouro Popular Português.

CUSTÓDIAS
Assim designadas por, na parte central, existir uma peça que sugere o expositor do Santíssimo. São também chamadas relicários, “relicairos”, “lábias” e “brasileiras”.
As mais populares são joias em filigrana, um pouco aberta e não muito apurada, embora existem algumas, feitas em Gondomar, com filigrana mais fina.
Chamam-lhes “lábias”, pela semelhança com os lábios da parte superior.
Brasileiras” porque, na altura em que os homens de Castelo de Neiva emigravam para o Brasil, quando vinham a Portugal visitar a mulher ou a namorada, tinham obrigatoriamente de comprar esta peça, mesmo que fossem imensos os sacrifícios feitos para esta aquisição, pois muitos dos que iam para estas paragens, vinham ainda mais pobres, mas esta era uma forma de demonstrar o contrário. A custódia era então orgulhosamente exibida, na missa dominical, e à saída, perante tal exibição, o povo diria “Olha a brasileira!” - daí a peça passar a ter essa designação.

PEÇAS OU MEDALHAS
São moedas autênticas embelezadas com espalhafatosas cercaduras chamadas “encastoamentos, nas quais se inserem umas presilhas com a finalidade de segurar a moeda sem lhe causar danos que altere o seu valor numismático. As moedas mais utilizadas eram as libras de cavalinho e cara de mulher (Rainha Vitória) - pois as caras de homem (Jorge V) não eram muito do agrado da mulher minhota - moedas de cinco e dez mil reis.
MEMÓRIAS
As memórias tinham quase sempre uma função saudosa. Eram transformadas em cofre, onde se encerrava uma madeixa de cabelo, fragmento de vestuário, pequena frase ou simples letra, breve oração, fotografia, bem como outras relíquias que constituem terna recordação de quem já não é deste mundo.

CRUZES
As cruzes são os símbolos iconográficos que atravessaram os séculos do cristianismo, não só como símbolos de Fé, mas também como identificação incontestável da religião do seu detentor, o que em determinadas épocas foi muito importante.
Surgem assim vários modelos de cruzes, do mais simples ao mais elaborado, respondendo quer ao gosto quer à capacidade financeira do povo.

CRUZ BARROCA
Eram feitas através do processo de estampagem do metal com o recurso a moldes, sendo oca, mas que dava a perceção de um objeto pesado e portanto valioso.
Como não revelavam a imagem do Crucificado, também eram designadas por “cruz de ouro mal obrado”.



CRUZ DE MALTA OU ESTRELA
São cruzes feitas em filigrana muito elaborada e guarnecidas com curiosos esmaltes.
Trata-se do símbolo da Ordem dos Cavaleiros de Malta (Cavaleiros Hospitalários), que me Portugal teve grande implantação desde o sec.XIII.

CRUZ DE RAIOS
Cruz em canovão com avantajado resplendor, arredondado, aureolando quase totalmente Jesus. Por via de regra, mostra muitas vezes a Senhora da Soledade aos pés do Filho.

CORAÇÕES
Os corações é outra das temáticas muito utilizadas na joalheria, surgindo com várias técnicas e feitios.  

CORAÇÕES OPADOS (ocos e bojudos)
Fabricam-se através da técnica da estampagem em chapa muito fina e são decorados com finos fios de filigrana ou um granulado. Têm motivos de amor, florais ou religiosos. Podem ser flamejantes ou chamados duplos, por terem como que um duplo coração por cima do maior, mais não sendo que a estilização de chamas.
Eram estes os mais usados pela mulher vianesa.  

CORAÇÕES DE FILIGRANA
Os corações de filigrana que aparecem hoje muitas vezes ao peito da vianesa não eram usados noutros tempos com tal frequência, por um lado, por causa da sua grande mão-de-obra que os tornava mais caros, e por outro, os fabricantes na tentativa de os tornarem mais acessíveis faziam-nos normalmente em prata dourada, metal considerado menos nobre ao gosto do povo.
Convém esclarecer, que ainda hoje a prata dourada é metal utilizado na maior parte dos que atualmente se fabricam. 

LAÇA
A Laça é uma joia de intervenção real, depois, popularizada. Formada por duas peças. Foi atribuída a D. Maria Ana de Áustria, a célebre “laça das esmeraldas”. É a primeira joia verdadeira do Minho, constituída por uma laçada dupla e decoração de fios enrolados, podendo ter um diamante ao centro. O seu nome provém da argola que tem por trás para ser usada com uma fita de seda. Mais tarde, tomaram a forma que tem hoje – coração invertido.


No próximo artigo desta série falaremos de JOALHERIA MASCULINA

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