terça-feira, setembro 25, 2012

MEIAS – Lingerie ou uso externo?

por TRAJAR DO POVO EM PORTUGAL

Há duas histórias diferentes no que respeita ao uso das meias: na nobreza/burguesia e no povo. Por outro lado, a história das meias é indissociável da história das malhas, uma das técnicas de entrelaçamento de fios e fibras, de modo a produzir tecidos.

 
MALHAS
 
O entrelaçamento de fios com laçadas nasceu no Egipto antigo, onde as agulhas de osso e madeira desempenhavam um papel importante. Na mitologia grega apresentasse-nos o caso da esposa de Ulisses, Penélope, que para resistir ao casamento com um pretendente que afirmava estar Ulisses já morto e perante o interesse de seu pai nesse segundo casamento, pediu que a deixassem terminar uma peça de tecido; o decido aumentavam de dia e diminuía de noite, pelo que a ardilosa grega apenas poderia estar a usar a técnica da malha.
 
Com efeito, a malha recorre a laçadas que se desfazem, enquanto a tecelagem usa o cruzamento ortogonal de fios (teia e trama) nos dispositivos básicos ou manuais ou a combinação destes com fios enviesados (por exemplo para a produção de sarjas) ou torção de alguns destes fios (originando texturas encaneladas) ou ainda com a introdução de fios com cores diversas para obter padrões com figuras na própria tecelagem.
 
A malha “do povo” usa um único fio e é obtida por trama, equivalente à progressão no sentido horizontal do tecido. A malha industrial pode incorporar de um a muitas dezenas de fios e o seu enlaçamento evolui por teia, ou seja: o tecido cresce no sentido vertical. Este princípio é fundamental para quem quiser diferenciar a natureza de um tecido de malha.

MEIAS NA NOBREZA/BURGUESIA
O uso sistemático de meias, obtidas por processos de fabrico elaborado iniciou-se no exército romano, nas campanhas militares de inverno nas regiões mais frias da Europa central e nórdica. No decorrer do século XIV entrou para o uso cortesão dos homens, através de uma moda que nasceu em Espanha e se espalhou por todas as cortes e palácios da Europa. O seu uso estava apenas confinado aos homens, havendo uma frase célebre do ultra-católico Filipe IV, em relação a uma oferta de meias de seda que fizeram à sua esposa e que ele recusou com grande azedume: “As mulheres não têm pernas!”.
 
Foi preciso chegar ao final do séc. XVIII e à boleia dos ventos que sopraram da revolução francesa, para que as meias fizessem parte da indumentária feminina… nas classes dominantes.
 
Em pleno século XX, em Portugal, as meias de algodão produzidas em maquinaria de malha, começaram a chegar e a ser produzidas para serem usadas pelas mulheres que iam diminuindo o comprimento das saias. Nos anos 20 e 30 já muitas mulheres da burguesia portuguesa as usavam e depois desta data, também as cachopas que se vestiam “à rancho” o começaram a fazer.


1880

MEIAS NO POVO
Livre de preconceitos, sujeito a necessidades e sem outros recursos do que os que cada região possui, o povo terá usado meias, no masculino e no feminino, antes das classes dominantes. Naturalmente, não como adorno, mas como necessidade nas estações mais frias do ano.
A proteção aquecida dos pés e pernas, começou por ser feito com pele de animais e foi evoluindo para soluções mais elaboradas e confortáveis, sendo incontornável o uso de fibras animais, pelo seu aconchego. Já se perdeu o aproveitamento dos pelos dos cavanhaques dos bodes (excecionalmente compridos) para fazer meias, do mesmo modo que se perdeu o uso das cerdas lombares dos porcos para fazer pincéis. Permanece a lã.




1880
Resulta assim, que as meias do povo são de lã, com malha manual, por vezes feitas com muita criatividade, tal como intercalar fios de lã com cores alternadas (lã branca e lã churra de cor castanha). Estas meias e estes usos podem ser indistintamente tomados pelas mulheres e pelos homens.
No caso concreto dos usos femininos nas mulheres do povo, as meias de algodão com rendados, desenhos e feitios, são de uma inutilidade total, pois as saias tapam até aos artelhos e não proporcionam os mesmos resultados aconchegantes das meias de lã. Convém não esquecer que até meados do século XX, em Portugal, a moralidade a que a mulher portuguesa estava sujeita, ainda aplicava a frase de Filipe IV: as mulheres não têm pernas.
Podemos concluir que no período onde pesquizamos e reproduzimos o trajar nos grupos de folclore (de finais do século XIX até primeiras duas décadas do século XX), as meias são uma peça de lingerie para as mulheres das classes dominantes e uma peça de uso externo e circunstancial para as mulheres do povo.

 
PS : queria acrescentar uma pequena explicação das fotos aqui colocadas no post.  São fotos do Minho, minhotos em trajes de festas na zona de Viana do Castelo com data 1880, e fotos de chinelos de Guimarães tirados da Ilustração Portuguesa de 1909.

Queria apontar que o uso dos "ranchos" dessa zona tem por habito usar meias de renda branca, ora aqui temos fotos a provar o contrario ou seja, a demostrar que não era "regra rígida"!!!!
Sendo assim uma minhota poderia usar durante a semana, ou numa grande ocasião todas essas possibilidades :

1.     Não usar meias
2.     Usar meias de lã
3.     Usar meias as riscas
4.     Usar meias de cor
5.     Usar meias rendadas.
Em conclusão a verdade esta na variedade e na simplicidade.

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