sexta-feira, fevereiro 28, 2014
O Carpidar dos Mortos
Excerto da encenação 'Fé nas Tradiçoes' pelas Cantadeiras do Neiva, 1º Lugar na Final do Concurso de Etnografia, organizado pelo INATEL, no dia 29 NOV 2009, no Centro Cultural Vila Flor - Guimarães
segunda-feira, fevereiro 24, 2014
Rituais da morte e o luto no traje
De todos os mistérios de vida dois são certos,
o nascimento e a morte. Se o primeiro é encarado com alegria e regozijo, o
segundo é trágico e triste, muito embora a doutrina cristã defenda ressurreição
da alma.
Por ser um assunto difícil de abordar na
nossa sociedade, os trajes de luto e os rituais da morte raramente são
representados pelos grupos etnográficos e folclóricos.
Não querendo ser extenso nesta matéria,
procurei alguns apontamentos etnográficos que caracterizassem estes momentos da
vivência de qualquer pessoa.
Os rituais fúnebres, além de possibilitarem
contactos afetivos e de conforto entre parentes, apresentam simbologias que
pretendem concretizar o ocorrido.
Retrato de mulheres, sec.XX,
Museu de Arte Popular,
Instituto dos Museus e da Conservação, I.P. / Ministério
da Cultura
|
Em Portugal os rituais da morte são
profundamente influenciados pela tradição católica, resultando num protocolo
rígido na representação da infelicidade da família enlutada perante a sociedade.
O preto era a cor do luto e quer homens, mulheres
ou crianças, despojavam-se das demonstrações exteriores alegria, havendo uma
enorme preocupação em cumprir o luto devido por morte de um familiar. No caso
de pais ou filhos eram de 18 meses a 2 anos, de um irmão 1 ano, avós 8 meses e
tios 3 meses.
Se havia um casamento marcado adiava-se, a
matança não era feita, não havia festas até passar o tempo de luto fechado,
depois começava-se a aliviar o luto até aos 2 anos.
O anúncio da morte de alguém era feito pelo
toque do sino da igreja (o chamado “dobrar” que ainda hoje assim se faz em
algumas regiões) e depressa passava de boca-em-boca o nome do falecido.
Os defuntos não iam para a igreja, eram
velados em casa. A casa era desprovida de quaisquer elementos decorativos e até
o relógio era levado para casa de uma vizinha para não se ouvir o barulho do
pêndulo. A casa era despojada de móveis e a vizinhança emprestava as cadeiras. Em
algumas aldeias a água que havia nos cântaros era deitada fora e também se
tiravam os enchidos que estavam na chaminé.
O corpo era arranjado, vestido com a melhor
roupa, muitas vezes já previamente predestinada (o fato da mortalha), e ficava
em cima da cama, até que no dia seguinte era enrolado numa colcha, metido no
caixão e saíam com ele a pé para o cemitério. Junto à cama era colocado um copo
ou uma taça, com um raminho, com o qual se aspergia o morto.
"Carpideiras no funeral de Juan Lara" - 1951 - Cáceres - W.Eugene Smith |
Com grandes prantos, fazendo elogios ao
falecido e maldizendo a sorte carpidava-se o morto demonstrando a dor da família
enlutada, tarefa relegada para os elementos femininos da família, ou “contratavam-se”
carpideiras para demonstrar que o falecido era muito querido.
Se era uma criança (os anjinhos ou injinhos), o corpo era colocado numa
urna branca e levado ao cemitério por crianças mais velhas. Se era uma rapariga
donzela, vestiam-na de noiva com uma grinalda.
Depois do funeral era a vizinhança que
cozinhava para a família enlutada e que ajudavam na limpeza e arrumação da
casa. No Alentejo a casa não era caiada, nem nessa altura, nem durante o tempo
do luto.
Durante todo o tempo de luto fechado os
amigos e a vizinhança mais próxima repartiam o que havia com a família enlutada,
respeitando a infelicidade e ajudando uns aos outros.
No que respeita à missa de 7º dia, está relacionada
com a tradição católica e às referências na Bíblia ao luto de 7 dias:
·
O luto de Jacó durou 7 dias (Gn 50,10)
·
Saul foi enterrado e fizeram um jejum de 7
dias (1Sm 31,13)
·
O povo chorou a morte de Judite durante 7
dias (Jt 16,24)
·
O luto por um morto dura 7 dias (Eclo 22,11)
O
Luto no Trajo
Viúva - Rancho Folc. Casa do Povo da Glória do Ribatejo |
Em Portugal os rituais da morte entre os
finais do sec.XIX e início do sec.XX têm origens muito antigas e diversas influências
culturais, resultando num protocolo rígido na representação da dor da
família enlutada perante a sociedade
Na tradição popular portuguesa o luto era
profundamente vivido e socialmente controlado. Essa vivência fazia com que fossem colocados de lado os trajos mais
vistosos, muitas vezes para o resto da vida, como aconteceu com o traje de
branqueta da Póvoa do Varzim após o naufrágio de 1892, que enlutou a maioria
das famílias dessa região, apenas sendo ressuscitado em 1936 por Santos Graça.
Pormenores
do luto no trajo feminino:
Por morte de um
parente, as mulheres vestiam-se de preto e quase tapavam o rosto, sendo
socialmente apontadas ou marginalisadas aquelas que não o fizessem. Era sinal de
respeito quase religioso.
Retrato de camponesa, sec.XX, Museu de Arte Popular, Instituto dos Museus e da Conservação, I.P. / Ministério da Cultura |
A mulher cobre a cabeça com o
mais singelo dos lenços negros e as capas, saias de costas, xailes e biucos
criam um “casulo” interiorizando a dor e isolando-a do mundo que a rodeia de forma a se tornar invisivel à sociedade.
No Alentejo e Algarve a mulher não tirava o
lenço da cabeça nem o xaile das costas. Mesmo no trabalho do campo, de Verão ou
Inverno, as mulheres usavam grandes xailes em bico, meias, lenço e chapéu.
No Minho surge o Traje Escuro ou Dó em sinal de luto ou quando um parente partia para o
estrangeiro. Usado para simbolizar dor pela separação, motivada por ausência
temporária ou mesmo definitiva de um parente. Na verdade, a diferença marcante
dos demais trajes, deve-se a tonalidade que no caso presente e como não poderia
deixar de ser predomina a cor preta.
Na Póvoa do Varzim a mulher usava casaco e saia pretos, lenço preto na cabeça,
embiocado, e uma saia de costas, também preta, muito semelhante à saia de
vestir, com pregas miúdas junto à cintura, embora mais curta e com menos roda.
Colocada sobre a cabeça, envolve o corpo até à cintura. O trajo de luto anulava praticamente a figura da
mulher. Como sinal de tristeza profunda, de renúncia ao conforto e
desprendimento dos bens materiais, esconde o rosto dos olhares intrusos e anda
descalça.
"Mulher da Nazaré", Artur Pastor |
Também na Nazaré a capa,
colocada sobre a cabeça, esconde a cara da mulher e o seu sofrimento, nesta
altura chapéu perde o tradicional pom-pom de lã.
No que se refere às joias,
durante o luto fechado apenas utilizavam os brincos, aos quais eram cozidos uns
paninhos pretos para disfarçar o brilho do ouro, ou então, para quem tinha essa
possibilidade, usava brincos com pedras escuras: azeviche, granada,
hematita, e ônix.
Em Portugal, no concelho da Batalha, nas
minas de Alcanadas (Barrojeiras e de Chão Preto), até ao início do século XX,
era extraído o azeviche utilizado na realização de jóias usadas durante os
períodos de luto da família pela Família Real Portuguesa. Também era extraido azeviche em Peniche.
Pormenores
do luto no trajo masculino:
No Alentejo e Algarve os homens andavam com a barba grande pelo menos durante 1 mês e não iam à taberna. Em algumas localidades usavam um lenço amarado à cabeça por debaixo do boné ou do chapéu.
O uso do Gabão também era comum, sobretudo na Póvoa do Varzim e Nazaré. Este era feito de tecido de lã castanha (saragoça) com cabeção, capuz e mangas compridas. Nas frentes, carcela e bolsos metidos a costura era pespontada a branco. Forro de branqueta. O capuz cobria não só a cabeça, mas ocultava o próprio rosto, resguardando-o de olhares estranhos
Brincos de 1880 em azeviche.
Acervo do Metropolitan Museum
|
Aos homens eram impostas menos regras sociais
que ás mulheres, para além do resguardo do tempo de luto obrigatório.
Genericamente o homem também adoptava o fato
preto, ou da cor mais escura que tinha. Mesmo no trabalho passa a vestir-se integralmente
de preto.No Alentejo e Algarve os homens andavam com a barba grande pelo menos durante 1 mês e não iam à taberna. Em algumas localidades usavam um lenço amarado à cabeça por debaixo do boné ou do chapéu.
O uso do Gabão também era comum, sobretudo na Póvoa do Varzim e Nazaré. Este era feito de tecido de lã castanha (saragoça) com cabeção, capuz e mangas compridas. Nas frentes, carcela e bolsos metidos a costura era pespontada a branco. Forro de branqueta. O capuz cobria não só a cabeça, mas ocultava o próprio rosto, resguardando-o de olhares estranhos
sexta-feira, fevereiro 21, 2014
Alpercatas - Açores
Local de Execução: Ilha do Pico
Datação: XIX d.C. - XX d.C.
Matéria: Cabedal; Pneumático; Metal
Dimensões (cm): altura: 5; largura: 12; comprimento: 26;
Datação: XIX d.C. - XX d.C.
Matéria: Cabedal; Pneumático; Metal
Dimensões (cm): altura: 5; largura: 12; comprimento: 26;
Descrição: Alpercatas (par) com rasto em pneumático
de cor preta. Sobre este, estende-se um rectângulo de cabedal, preso ao
pneumático por meio de pregos metálicos. À sola estão presas correias de
cabedal passadas, à frente, sobre os dedos, e atrás, sobre o calcanhar,
enrolando depois na perna até à altura dos tornozelos.
Proveniência: Portugal / S. Roque do Pico / Santa Luzia.
Proveniência: Portugal / S. Roque do Pico / Santa Luzia.
Datação: XIX d.C. - XX d.C.
Matéria: Cabedal; Pneumático; Metal
Dimensões (cm): altura: 6; largura: 13; comprimento: 30;
Descrição: Alpercatas (par) com rasto em pneumático
de cor preta. Sobre este, estende-se um rectângulo de cabedal, preso ao
pneumático por meio de pregos metálicos. À sola estão presas correias de
cabedal passadas, à frente, sobre os dedos, e atrás, sobre o calcanhar,
enrolando depois na perna até à altura dos tornozelos.
Proveniência: Portugal / Madalena / S. Caetano
Proveniência: Portugal / Madalena / S. Caetano
Datação: Séc.
XIX - XX (?)
Dimensões
(cm): largura: 13,9; comprimento: 27;
Descrição:
Sapato também designado por abarca ou albarca, com sola de forma retangular,
com rebordo na frente levantado; tem quatro orifícios, pelos quais passam tiras
de cabedal estreitas (atacas) que servem para segurar a sola à canela das
pernas. Segundo João Afonso "O trajo nos Açores, subsídio para Estudos de
Vestiaria Antiga ", O instituto Históricos da Ilha Terceira, Angra do
Heroísmo, 1978, p 134 ... O rebordo não era característico na sapata
terceirense, mas aparece já neste calçado, ainda muito apreciado do "homem
do monte ". Antigamente abarca (MAR). Calçado rústico exclusivamente usado
por gente do Pico. --- (MAP)
Fontes:
www.matriznet.imc-ip.pt. e Museu de Arte Popular.
segunda-feira, fevereiro 10, 2014
Entrevista à Rádio do Folclore Português
No passado dia 2 de Fevereiro este blog foi tema de conversa numa entrevista ao programa de Sergio da Fonseca na Rádio do Folclore Português.
Para quem não assistiu em direto, aqui fica a entrevista.
Para quem não assistiu em direto, aqui fica a entrevista.
Subscrever:
Mensagens (Atom)