Despedem o Inverno e saúdam a Primavera, para os caretos o Carnaval é um ritual entre o pagão e o religioso, tão natural como a passagem do tempo e a renovação das estações. Em Podence, concelho de Macedo de Cavaleiros, todos os anos é assim. Chegado o Mês de Fevereiro, os homens envergam os trajes coloridos (elaborados com colchas franjadas de Lã ou de linho, em teares caseiros) escondem a cabeça entre duas máscaras de lata, prendem uma enfiada de chocalhos á cintura e bandoleiras de campainhas e dependem toda a energia do
Dizem fontes que a festa de Podence se imerge no domínio dos tempos até às antigas Saturnais romanas – celebração em honra de Saturno, Deus das sementeiras. Procura-se acalmar a ira dos Céus e garantir favores de uma boa colheita. Nesses tempos idos da agricultura de subsistência, a diferença entre a vida e a morte quase se cingia à dimensão da lavra. Passados á parte, em Podence ainda hoje a agricultura é a principal actividade da população. Da terra se extrai cereais e castanhas, embora nos últimos anos, tenha aumentado a produção de azeite. A aldeia de Podence parece ter força suficiente para manter tradição e garantir a vida a estas figuras, recheados de homens endemoninhados, armados de chocalhos e rédea solta para as tropelias. Mesmos, explicam os mais velhos, o tempo tenha brandado a folganças e as moças da terra já não sintam tantas nódoas no corpo. Nos anos 70, a tradição esteve a perder-se, à conta dos últimos anos de ditadura e do fenómeno da emigração. Hoje são muitos os homens com fatos de Carreto e energia para invadir a praça na aldeia domingo e terça feira de Entrudo. E o futuro está garantido através dos Facanitos (crianças com fatos idênticos aos mais velhos) prontos a tomar o testemunho. Os outros, aquelas que não podem envergar a fatiota, abrem as adegas para apaziguar a secura os folgazões. A imunidade conferida pela máscara, permite aos caretos mergulhar nos excessos. Sendo as mulheres solteiras as vítimas preferências. Encostam-se a elas e ensaiam estranhas danças com conteúdo erótico, agitando a cintura e batendo com os chocalhos nas ancas das vítimas que acompanham a dança. Entre o barulho festivo, a risota e o alarido lembram-se outros tempos em que as mulheres se escondiam em casa pois os foliões iam muito para além dos chocalhos, lançavam cinza, dejectos e fustigando as incautas com pele de
Ao careto mau diabo á solta pelas ruas de Podence, querem-no vivo em cada Fevereiro, mesmo que á conta disso não possam dormir descansadas as moçoilas.
A eles tudo se permite; o anonimato dá-lhes prerrogativas: dá-lhes poder. Por dois dias no ano os homens são crianças e quem mais brinca mais poder tem.
Site de referência: Caretos de Podence
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