quinta-feira, setembro 27, 2007

Caretos – Podence – Trás-os-Montes

Os caretos usam máscaras rudimentares, onde sobressai o nariz pontiagudo, feitas de couro, madeira ou de vulgar latão, pintadas de vermelho, preto, amarelo, ou verde. A cor é também um dos atributos mais visíveis das suas vestes: fatos de colchas franjados de lã vermelha, verde e amarela, com enfiadas de chocalhos à cintura e bandoleiras com campainhas. Da sua indumentária, faz também parte um pau que os apoia nas correrias e saltos. A rusticidade do ambiente é indissociável desta figura misteriosa.
Despedem o Inverno e saúdam a Primavera, para os caretos o Carnaval é um ritual entre o pagão e o religioso, tão natural como a passagem do tempo e a renovação das estações. Em Podence, concelho de Macedo de Cavaleiros, todos os anos é assim. Chegado o Mês de Fevereiro, os homens envergam os trajes coloridos (elaborados com colchas franjadas de Lã ou de linho, em teares caseiros) escondem a cabeça entre duas máscaras de lata, prendem uma enfiada de chocalhos á cintura e bandoleiras de campainhas e dependem toda a energia do
mundo para assinalar o calor e os dias maiores que se prestem a chegar. Normalmente, contam com os favores do Sol, magnânimo para quem louva o seu reino com tanto fervor. Religioso também pois assim se marca, com os últimos estertores da folia o início da Quaresma. Período de calma, reflexão e contenção do calendário religioso. A cansar no Carnaval para acalmar até á Páscoa.
Dizem fontes que a festa de Podence se imerge no domínio dos tempos até às antigas Saturnais romanas – celebração em honra de Saturno, Deus das sementeiras. Procura-se acalmar a ira dos Céus e garantir favores de uma boa colheita. Nesses tempos idos da agricultura de subsistência, a diferença entre a vida e a morte quase se cingia à dimensão da lavra. Passados á parte, em Podence ainda hoje a agricultura é a principal actividade da população. Da terra se extrai cereais e castanhas, embora nos últimos anos, tenha aumentado a produção de azeite. A aldeia de Podence parece ter força suficiente para manter tradição e garantir a vida a estas figuras, recheados de homens endemoninhados, armados de chocalhos e rédea solta para as tropelias. Mesmos, explicam os mais velhos, o tempo tenha brandado a folganças e as moças da terra já não sintam tantas nódoas no corpo. Nos anos 70, a tradição esteve a perder-se, à conta dos últimos anos de ditadura e do fenómeno da emigração. Hoje são muitos os homens com fatos de Carreto e energia para invadir a praça na aldeia domingo e terça feira de Entrudo. E o futuro está garantido através dos Facanitos (crianças com fatos idênticos aos mais velhos) prontos a tomar o testemunho. Os outros, aquelas que não podem envergar a fatiota, abrem as adegas para apaziguar a secura os folgazões. A imunidade conferida pela máscara, permite aos caretos mergulhar nos excessos. Sendo as mulheres solteiras as vítimas preferências. Encostam-se a elas e ensaiam estranhas danças com conteúdo erótico, agitando a cintura e batendo com os chocalhos nas ancas das vítimas que acompanham a dança. Entre o barulho festivo, a risota e o alarido lembram-se outros tempos em que as mulheres se escondiam em casa pois os foliões iam muito para além dos chocalhos, lançavam cinza, dejectos e fustigando as incautas com pele de
coelho seca ou bexiga de porco fumada. Para não falar no banho de formigas, broma pesada e cruel com espécimes selvagens recolhidos nos campos durante meses. Também as casas eram invadidas e panela ao lume era panela condenada a verter o conteúdo para mal da barriga dos infelizes.
Ao careto mau diabo á solta pelas ruas de Podence, querem-no vivo em cada Fevereiro, mesmo que á conta disso não possam dormir descansadas as moçoilas.
A eles tudo se permite; o anonimato dá-lhes prerrogativas: dá-lhes poder. Por dois dias no ano os homens são crianças e quem mais brinca mais poder tem.
Site de referência:
Caretos de Podence
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Trás-os-Montes

quarta-feira, setembro 26, 2007

Trajos de Apanhadores de Chá – Ilha de São Miguel - Açores

Os Açores são a única região europeia a produzir chá.
Não havendo um registo oficial da data de introdução do chá na ilha de S. Miguel, a partir de vários relatos acredita-se a inserção inicial datar de 1750. Em 1878, a Sociedade Promotora da Agricultura Micalense procurou impulsionar a agricultura local, escolhendo a cultura do chá como umas das vertentes a apoiar. Assim no mesmo ano, chegaram a S. Miguel dois chineses da cidade de Macau, contratados com a finalidade de desenvolver as técnicas desta cultura. O cultivo do chá, encontra nos Açores condições favoráveis ao seu desenvolvimento, sendo a ilha de S. Miguel a que reúne as melhores. Até meados do século XX havia 12 a 15 plantações de chá nos Açores, principalmente na costa norte da ilha, no concelho de Ribeira Grande. A produção começou a decair, principalmente com a política do Estado Novo de protecção ao chá de Moçambique. Depois, a pouco e pouco, foram desaparecendo. Actualmente restam somente duas plantações, a da Gorreana e a de Porto Formoso.
Esta longa tradição de cultura de chá influenciou a indumentária regional, adaptando o trajo à actividade específica da colheita.
O homem usa um chapéu de palha feito com tranças de 6 pernas. É diferente do das mulheres porque estes são feitos com tranças de 8 pernas. A camisa é bastante comprida, até aos joelhos, com aberturas aos lados. As mangas são pouco franzidas e terminam com punho abotoado por um botão. Junto ao pescoço é rematado por um cós baixo a partir do qual, e ao meio, tem uma trincha que remata com botões. A fazer o peito tem nervuras perpendiculares que terminam na altura da trincha. Calças largas de cor igual à camisa e sandálias de cabedal com tira larga sobre o pé deixando os dedos à mostra.
A mulher usa a cabeça coberta com um lenço branco que envolve o rosto e amarra sobre a nuca. Chapéu de aba larga em palha, feito muitas vezes pelas próprias mulheres. Blusa branca com nervuras nas mangas, que são compridas, rematando em baixo com um folhinho de bordado inglês. A blusa, confeccionada em linho grosseiro, é usada por fora da saia de xadrez de duas cores. A saia é franzida na cintura e deve rematar com um cós baixo abotoado com um botão simples e com uma abertura que fecha com molas. Nos pés usa meias brancas rendadas e galochas simples, que devem ser cepos de madeira cobertos de tecido.
Referência Bibliográfica: Tomaz Ribas in O Trajo Regional em Portugal, Difel, 2004
Sites recomendados:
Plantações de Chá Gorreana
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terça-feira, setembro 25, 2007

Trajo de Duas Saias – Ilha de S. Jorge – Açores

Este é um trajo utilizado em diversas zonas da Ilha de São Jorge, mas também se podem encontrar indumentárias semelhantes no continente, na região da Estremadura.
Existem ainda registos de trajes semelhantes na Irlanda.
Este trajo é composto por duas saias de baeta creme, com barra cor-de-rosa, franzidas na cintura com cós e abertura lateral. São iguais, cada qual servindo no seu sentido, ou superior ou inferior. É citada por vários escritores como saia de ombros. Por baixo tem uma blusa ampla, de pano alinhado branco, com duas pregas fundas na frente e nervuras nos lados. É guarnecida por bordado inglês e franzida nos punhos e em volta do pescoço. Na cabeça, um lenço de lã estampado com flores e barras azuis. Calça meias de lã, feitas com agulhas e sapatos de sola de correola e cortes de baeta bordados a ponto pé de flor.
Referência Bibliográfica: Tomaz Ribas in O Trajo Regional em Portugal, Difel, 2004
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segunda-feira, setembro 24, 2007

Mulher da Fábrica de Conservas – Algarve


No final do sec.XIX surgem no Algarve as primeiras fábricas de conservas de peixe. A primeira surgiu em Vila Real de Santo António em 1879 pelas mãos de um italiano de nome A.Parodi. Quase de imediato, começaram a surgir pequenas fábricas conserveiras, atingindo, em 1945, 246 unidades.
As mulheres constituíam a principal mão-de-obra desta indústria, trabalhando em condições deploráveis.
A sirene da fábrica era o sinal mais esperado. O seu toque anunciava a chegada de peixe fresco e, consequentemente, a possibilidade de trabalho durante algumas horas. Nessa altura, uma turba de mulheres corria para a fábrica, na esperança de serem as primeiras e as escolhidas para trabalhar.
Inicialmente, não existiam condições de higiene e esta reflectia-se na indumentária das operárias, no entanto, com a evolução dos tempos foram sendo introduzidas algumas normas, nomeadamente, a obrigatoriedade do uso de vestuário de cores claras, lenços na cabeça e aventais de cor branca.
A operária da fábrica de conservas usava um lenço de cabeça de algodão branco, estampado com motivos florais. Bata de trabalho, também em algodão de cor clara, de corte simples e sem gola. Aberta na frente e de manga comprida, com punhos. Saia de algodão de cor escura, com aplicações do mesmo tecido. Avental com peitilho de linho branco, comprido, cobrindo quase totalmente a saia, possui um bolso estampado no lado direito. Calça tamancos de madeira com a parte superior em cabedal.
Referencia Bibliográfica: Andrade Sancho, Emanuel in Traje do Algarve – Orla Marítima, Museu Nacional do Traje, 2001
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Algarve

quinta-feira, setembro 20, 2007

Festa dos Tabuleiros – Tomar - Ribatejo


O Dr. Fernando Araújo Ferreira afirmava «o tabuleiro é um hino de cor. Um poema nascido da arte popular tomarense. Das mãos e inspiração do seu povo. Obedecendo a regras tradicionais, é ele que o arma é ele que o ornamenta. De gerações em gerações passou o jeito, a herança bonita. O Tabuleiro é uma oferta de pão, por isso o pão deve ficar à vista, a ornamentação pertence ao gosto de quem o decora, com flores de papel e verdura se for caso disso. O Cortejo vive e encanta pela variedade de cores e ornamentações.»
O historiador Dr. Manuel Guimarães, traduz a emoção de quem vai no Cortejo e quem assiste à sua passagem: «As raparigas, figuras principais, desfilam em duas longas filas ao lado dos seus ajudantes (os rapazes) que seguem do lado de dentro mas sempre atentos às companheiras. Dirigem-se à Praça da República onde o Cortejo enrola harmoniosamente até preencher sem sobressaltos a placa central. Um representante da Igreja vem à Praça, paramentado, dar a bênção aos Tabuleiros. Depois, a um sinal do sino, é a elevação, um momento inesquecível. Uma moldura humana impressionante, aplaude comovida este momento mágico, único, pela sua grandiosidade, simbolismo e beleza, único na nossa arte e na nossa cultura.»
A Festa dos Tabuleiros ou Festa do Divino Espírito Santo é uma das manifestações culturais e religiosas mais antigas de Portugal. Segundo os investigadores a sua origem encontra-se nas festas de colheitas à deusa Ceres. A sua cristianização pode dever-se à Rainha Santa Isabel que lançou as bases do que seria a Congregação do Espírito Santo, movimento de solidariedade cristã que em muitos lugares do reino absorveu as primitivas festas pagãs. O ponto alto das festividades que juntava ricos e pobres sem qualquer distinção ocorria no Domingo de Pentecostes, dia em que as línguas de fogo desceram sobre os Apóstolos simbolizando a igualdade de todos perante Deus.
A principal característica da Festa dos Tabuleiros é o Desfile ou Procissão, com um número variável de tabuleiros, em que estão representadas as dezasseis freguesias do concelho. Esta procissão de dignidade, cor, brilho e emoção percorre as principais ruas da cidade, num percurso de cerca de 5 Km, por entre colchas pendentes nas janelas, milhares de visitantes nas ruas e uma chuva de pétalas que de forma entusiástica é lançada sobre o Cortejo.
A Festa é do Tabuleiro que deve ter a altura da rapariga que o leva à cabeça, sendo constituído por trinta pães (tantos quantas as chagas de Cristo) enfiados em cinco ou seis canas que partem de um cesto de vime ou verga e é rematado ao alto por uma coroa encimada pela Pomba do Espírito Santo ou pela Cruz de Cristo.
Na primeira metade do sec.XX convencionou-se que os participantes no desfile deveriam trajar da seguinte forma:
O Homem veste calça preta, camisa branca, com as mangas arregaçadas, e gravata da mesma cor da fita do traje feminino. Usa ainda um barrete preto sobre o ombro, onde apoia o tabuleiro sempre que é necessário aliviar o sofrimento da rapariga
A rapariga apresenta-se de saia branca até aos pés e blusa da mesma cor. Usa uma fita com a cor da freguesia que representa. Na cabeça, para apoiar o tabuleiro, uma “sogra” de cor branca e decorada com fitas da mesma cor da do vestido.
Site :
Festa dos Tabuleiros
Imagens de José Júlio Ribeiro in Olhares.com

terça-feira, setembro 11, 2007

Trajos e ir à feira (boieiros) – S. Pedro de Rates – Douro Litoral


As deslocações às feiras sempre se reverteram de grande importância. A possibilidade de efectuar bons negócios com a venda dos produtos da terra, investindo estes proventos na aquisição de bens que não produz, motivou desde sempre os homens. Era também uma forma de tomar contacto com as novidades, as noticias ou efectuar uma determinada compra, antevendo uma ocasião especial.
Estes trajos representam os boieiros de S.Pedro de Rates, freguesia do Concelho de Póvoa do Varzim, quando se deslocavam às feiras com o seu gado.
Neste conjunto, destaca-se no trajo da rapariga o tecido caseiro da saia e do avental, localmente conhecido por “trezes”. Esta designação ficou a dever-se às três fibras usadas na tecelagem, lã, linho e algodão. Também devido aos três pedais ou peanhas pertencentes ao tear onde era produzido. Quanto ao “chapéu de pano”, como era conhecido, embora sendo de feltro castanho ou preto, comprava-se na Póvoa do Varzim, numa chapelaria já desaparecida.
O homem veste uma camisa de linho, com colarete, aberta sobre o peito com pregas e carcela formando peitilho, manga comprida sem cavas, decorada com preguinhas miúdas na parte superior. Calças compridas de tecido preto, ajustadas na cintura com faixa preta. Colete do mesmo tecido, com bolsos. Cobre a cabeça com chapéu de feltro preto e calça sapatos da mesma cor.
A mulher veste camisa de linho branco, decote guarnecido com duplo folho bordado a branco, aberta no peito, manga comprida, bordada a branco no cimo e refegos junto ao pulso, terminando com folho. Saia de “trezes” com preguinhas junto à cintura e barra azul. Avental do mesmo tecido, franzido na cintura. Atada à cintura, por debaixo do avental, uma algibeira de tecido azul decorada com pespontos. Faixa preta sobre as ancas, arregaçando a saia e o avental.
Cruzado sobre o peito, lenço de lã estampado com motivos florais, policromados, terminado com franja vermelha. Na cabeça, lenço atado atrás sobreposto por “chapéu de pano” de copa baixa e aba larga. Sobre o peito pendem cordões e corações e nas orelhas pequenas argolas.

Referência Bibliográfica: O Trajo Regional em Portugal, Tomaz Ribas, Difel, 2004
Site recomendado:
Câmara Municipal de Póvoa do Varzim
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Pastor – Minde – Estremadura


No essencial este traje identifica-se com os seus congéneres da região, mantendo alguns acessórios comuns a todos os pastores, como sucede com a manta, sempre de tecelagem caseira local e decorada nos tons naturais da lã. Também a saca da merenda, a cabaça com água-pé e porreto são indispensáveis para o trabalho atrás dos rebanhos.
A zona de Minde era um importante centro de produção de mantas e também de tecidos para os hábitos dos frades, terá contribuído para o abastecimento de panos de lã às populações mais próximas.
Por outro lado, a circulação destes produtos, nomeadamente das mantas, pelas feiras de todo o País, muito em particular no Alentejo, terá contribuído para influenciar o seu desenho característico, as mantas de riscas.
Mas os contactos entre estas duas regiões, também traziam do Alentejo a lã que abastecia a insuficiente produção local.
O pastor vestia camisa de riscado com cós, aberta sobre o peito. Colete de cotim cinzento-escuro, ajustado com botões. Calças do mesmo tecido, com bolsos metidos nas frentes, ajustadas com cinta preta. Na cabeça, barrete de lã da mesma cor e lenço tabaqueiro ao pescoço. Sobre o ombro, manta de riscas de Minde. Segura na mão a saca de retalhos onde transporta a merenda, a cabaça e o varapau. Calça botas de couro ensebadas.
Referência Bibliográfica: O Trajo Regional em Portugal, Tomaz Ribas, Difel, 2004
Site recomendado: Câmara Municipal de
Alcanena
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