sexta-feira, outubro 31, 2008

Tamancos e Socos - Entre Douro e Minho

Segundo alguns autores, terá sido na região de Entre Douro e Minho a área primitiva do aparecimento do calçado de pau em Portugal.
Existiu em Guimarães uma confraria dos sapateiros, sob a evocação de Santa Maria, cuja constância no tempo vem desde o século XIII e se projectara numa continuidade admirável sob o título abreviado de Irmandade de S. Crispim, tendo sido fundada em 1315 pelos sapateiros João Baião e Pedro Baião.
Uma sátira em verso do séc. XVIII, que define os habitantes de Entre Douro e Minho, faz-se referência ao calçado de pau.
“Homem de Entre Douro e Minho
Calça de pau e veste linho,
Bebe vinho de enforcado,
Traz o porco escangado,
Foge dele como do diabo.”
Se bem que em tempos passados o povo tivesse andado descalço, este calçado impunha-se como meio de protecção na realização de alguns trabalhos agrícolas, tendo por isso os seus melhores defensores na gente da lavoura.
Feito de pau de amieiro e um pouco de couro, este calçado humilde tem também a sua história.
Popularmente, os tamancos têm as designações de socos e taroucos. Se a pessoa que os usava era uma mulher, os tamancos eram designados por tamancas, os socos por socas, e os taroucos passavam a ser taroucas.
A propósito deste assunto, José Leite de Vasconcelos, o mestre da etnologia, refere que “as mulheres usam tamancas ou socas, que são menores e mais apuradas do que os tamancos, mas com sola de madeira”.
De qualquer forma, o tamanco era mais usado pelo homem e o soco mais usual na mulher, sendo inquestionável que este foi o calçado dos pobres, sem esquecer que também os ricos o usaram em muitas emergências do tempo e da fortuna.
As próprias condições físicas do terreno foram as inspiradoras do artífice tamanqueiro. Nas terras do litoral, o pau do tamanco é raso. No interior, o tamanco começa a arquear a biqueira. Já nas terras bravas das serras, o tamanco arqueia ainda mais, cingindo o couro mais ao pé, para melhor se acomodar ao terreno e à marcha.

As oficinas dos tamanqueiros situavam-se sobretudo nas recônditas aldeias. O tamanqueiro talhava as peles (de couro para os socos de homem e de crute para os socos de mulher), e pregava-as aos paus. Utilizava moldes de cartão grosso para cortar as peles e uma forma para fixar o cabedal ao pau de amieiro através de tachas. O artífice percorria as aldeias em busca do amieiros, que só podia ser cortado nas quadras da lua. O fabrico do tamanco era sobretudo um trabalho de Inverno, pois aproveitavam as Feiras de Verão para vender os seus produtos.
Os socos não eram só para uso no trabalho, mas também aos domingos, dias de festa e mesmo para certos actos de maior importância, como casamentos. No caso dos actos cerimoniosos, eram muitas vezes usados socos feitos de melhores matérias e acabamentos mais luxuosos, mas como eram dispendiosos apenas estavam ao alcance de uma pequena minoria. Ainda assim, muitas vezes durante o trajecto para um acto cerimonioso ou na deslocação para uma povoação, o soco era mantido debaixo do braço para não se estragar e só à chegada o calçavam.
A seguir descrevem-se alguns tipos de socos:


Soca Curta – Soca de bico arredondado, salto baixo, e em que as pontas dos “cortes” terminam próximo da quina do salto. Os paus podem ser pintados de preto ou à cor natural, sendo forrada no interior. Este é um modelo muito popular mesmo noutras regiões.
Soca Inteira – É um tipo de soca, de mulher, mais fechada, em que as “orelhas” dos “cortes” se juntam atrás sobre o salto, ficando acima deste cerca de 2 cm. O bico é arredondado e o salto alto. Sendo forrada internamente com uma palmilha.

Soco Rebelo – As orelhas dos cortes são mais altas do que no soco poveiro, juntando-se atrás sem se sobreporem. Neste tipo de soco, a forma é metida a maço e os cortes batidos e alisados com o cabo do martelo, a fim de se conseguir a curvatura do bico, que é a sua principal característica.

Soco Poveiro – É o soco, para homem, mais vulgar da região. O seu nome deve-se a ter sido a Póvoa do Varzim o seu presumível difusor. Soco de ponta redonda, em que as orelhas dos cortes se juntam atrás sem se sobreporem, ficando acima do salto cerca de 3 cm. É mais aberto que o soco rebelo. Como todo o tipo de soco para homem, o pau é de cor natural e sem palmilha no interior.
Chanca Rebela ou de Ponte de Lima – Fabrica-se de couro atanado dividido em duas peças denominadas “gáspea com biqueira” e “cano” ou “talão”. O “cano” ou “talão” é sobreposto à “gáspea”, fechando a frente através de um cordão de couro. A ponta é bicuda e um pouco arredondada. Antigamente eram feitas a partir do aproveitamento da botas velhas, às quais mandavam aplicar os paus.

9 comentários:

Anónimo disse...

Permita-me anexar à sua descrição o famoso artigo de Benjamin Pereira:

PEREIRA, Benjamim Enes – Calçado de pau em Portugal, in Revista de Etnografia. Porto: [s.n.], 1966.

Cumprimentos,

Pedro Augusto

Unknown disse...

Quero comprar um tamanco para mim igual que vi de uma portuguesa na novela chamas da vida
aonde encontro
sou da baixada e nao tem lojas que encontre...obrigado me deixem mensagens em meu Mavunha@hotmail.com

helena disse...

helena, tudo o que se vê de PORTUGAL, ALEGRA O CORAÇÃO PRINCIPALMENTE NOS OS NETOS DOS PORTUGUESES QUE POR AQUI VIERAM E FICARAM NA DECADA DE 1904 MAIS OU MEE PRINCIPALMENTE AQUELES QUE TIVERAM A VENTURA DE CONHECER PORTUGAL A TERRA DE NOSSOS ANCESTRAIS COMO EU, BEIJINHOS BEIJINHOS A TODOS . RECOMENDAÇÕES HELENAKSO@hotmail.com

Anónimo disse...

Meu nome é Robson e sou folclorista aqui no Rio de Janeiro e quero um par de socos, possivelmente pretos para o meu traje. Como posso conseguir um par desses. Calço 41. Favor responder em e-mail:
robbsonrj@uol.com.br

Concha Rousia disse...

Eu gastava chancas como essas eram feitos os paus por meu pai, e depois mais tarde eram comprados na feira de Ginzo, e hoje eu escrevi meu conto de Natal falando das nossas chancas... há tanto que agradecer ao saber tradicional, que nos mantinha os pezinhos quentes... Gostei de ver que ainda há pessoas que nos esforçamos para não perder a memória.
Um abraço desde o outro lado do Minho.
Concha Rousia.

Unknown disse...

Olá
Sou Educadora de Infância no concelho de Amarante e pretendo caracterizar a região do Minho no Carnaval!
Gostaria que me indicasse a quem me devo dirigir para mandar fazer os tamancos dos meus alunos- dos 3 aos 6 anos de idade e adultos!
Terão que ser o mais económicos possivel
Cumprimentos

Carlos Cardoso disse...

Bom dia Senhorinha Teixeira

Pode encontrar esse tipo de tamancos em várias lojas, sobretudo de turismo, o preço varia conforme a qualidade. On-line pode contactar estes sites:
http://www.lojadofolclore.com/?link=produtos&categoria=45
http://principe-porto-portugal.pai.pt/
http://www.casabrincheiro.com.pt/inicio.php
Espero que encontre o que pretende.
Abraço Carlos Cardoso

Henrique Oliveira disse...

Muito interessante.

Unknown disse...

Olá Boa noite.
Assim como quem não quer nada, fui entrando pesquisando algo onde me apareceu este blogger com história e depoimentos interessantes sobre chancas tamancos.
sou tamanqueiro a 10 anos herdei de meu pai esta arte. pergunto quem me sabe dizer onde se encontram pauzeiros.