
Assuntos relacionados neste blog: Côca, Biuco e Capelo
Ficavam nos meses de Inverno a percorrer o Tejo e a suportar uma vida que era dura e difícil, como afirma Maria Micaela Soares: “(..) vinham em Novembro, trazidos pela penúria. Anónimos e tímidos se achegavam às margens do Tejo. Na época de vaivém entre a praia e a lezíria, moravam nas pequenas embarcações de proa alta, quer durante a faina, quer acostado. O barco era o berço, a câmara nupcial, a oficina e a tumba”.
A sua vinda para as terras de borda-d'água, não foi fácil porque “quando os avieiros chegaram à lezíria, encontraram já o rio sulcado de barcos, alguns maiores que os seus, e que eram conduzidas igualmente por pescadores que povoavam o Tejo, chamavam os da terra varinos.
Eles entre si designavam-se simplesmente pescadores, em oposição aos trabalhadores da terra. Os avieiros apelidaram-nos de Murtoseiros, qualquer que fosse o seu ponto de origem. Esta era, na sua maioria, a Murtosa, mas também vinham de Ovar e da Estarreja. Esses grupos, que haviam seguido na esteira do sável, fixaram-se nos extremos dos povoados ribeirinhos, junto às praias.
Alugavam as casas da beira-rio, onde habitavam várias famílias, para o aluguer ser mais acessível”.
Havia uma rivalidade entre ambos, o que provocava grandes rixas. Os varinos acusavam os avieiros de terem contribuído para a decadência da sua actividade piscatória, através da concorrência desleal das redes, os avieiros por sua vez também os acusavam de usarem este tipo de redes. O certo é que estes dois grupos não mantinham relações muito cordiais.
Com o passar dos tempos, o processo migratório cessa e acabam por se fixar nas margens no Rio Tejo, o nomadismo acaba e sedentarizam-se. Com a fixação definitiva, surge a necessidade de encontrar um domicílio mais estável, resistente e confortável. Pouco a pouco conquistam as margens do rio Tejo e começam a erguer pequenas barracas totalmente construídas em caniço, dado que este crescia de forma espontânea pelos valados.
A MULHER AVIEIRA
A mulher teve um papel muito importante na família avieira, para além de mãe e esposa, era também a “camarada” do pescador. Era ela quem remava e controlava o barco, enquanto o homem lançava as redes, ajudava também no conserto nas redes.
Após a pescaria fazia grandes caminhadas, de freguesia em freguesia, com a canastra à cabeça para vender o pescado, descalça sobre a geada ou debaixo do sol escaldante.
Apesar da fixação na lezíria ribatejana, a mulher avieira conservou genuinamente o seu traje de origem. Vejamos a descrição deste, segundo uma descrição de Maria Micaela Soares “(...) elas conservam puras muitas das suas tradições, com especial relevo para o vestir. Usam saia e blusa - a que a mais velha chama “casaco”, sendo aquela muito rodada ou em pregas miúdas. De tecido diferente, conforme a estação do ano, a saia tende sempre para o xadrez castanho-amarelado, embora se vejam também de cores muito garridas.
O “casaco” tem sempre manga comprida, é bastante colorido e muito enfeitado, com rendas ou bordados, mesmo nas menos jovens (...).
Também não dispensa o avental, bastante rodado, estimando muito os de riscas largas, de quadradinhos miúdos ou de cor lisa, bordados. Usa-o no trabalho do rio, doméstico, agrícola ou nas festas.
Na cabeça, a avieira mais idosa não prescinde do lenço, posto com pontas ao alto, à rodada-cabeça, caído pelos ombros, atado atrás. Só dentro da casa e nos grandes calores estivais o retira e, mesmo assim, se alguém chega à porta, repõe-no imediatamente, que não parecia bem sem ele. Faz parte do decoro da sua apresentação. Quando de luto, nem em casa o afasta.
Interiormente as mais velhas trazem ainda camisa com “ombrêras”, além da saia branca de baixo, tudo com rendas.
Grande anseio de todas é a posse de um cordão e grandes medalhas, que ostentam mesmo sobre fatos de luto (...)”.
O HOMEM AVIEIRO
Trajo do avieiro, também nos reporta para a sua área geográfica da Vieira de Leiria “de camisa axadrezada, em tons castanhos e amarelos, de preferência e não já de pano-cru; calça de fazenda ou de cotim, arregaçada, tal como a ceroula interior, ou largas bragas de zuarte, antigamente,mas de ganga hoje; boina de pala curta em vez de barrete de outrora, em geral preto, mas que também fora azul ou vermelho, com ou sem borla, cinto de cabedal ou mero cordão, pela cinta preta de outros tempos, camisolas e casacos de malha ou de tecido grosso a destronarem o gabão de capucha e farto cabeção, pés de descalço sempre - eis o velho avieiro”.
Bibliografia: Maria Micaela Soares, “Mulheres da Estremadura” In Boletim Cultural da Assembleia Distrital de Lisboa
Rancho Folclórico "Os Avieiros" do Escaroupim (Página Provisória)
O trajo da mondadeira do arroz: Saia de roda, de ganga ou de riscado, blusa de chita, avental de pano; duas ou três saias de baixo, recortadas, juntas à de cima e pregadas com alfinetes à volta de cada perna; a atar tudo, o nastro, espécie de cinta para ficar bem alto o conjunto; lenço colorido com motivos florais e, por altura do calor, um chapéu de palha por cima; canos nas pernas, geralmente escuros; pés descalços e enegrecidos, os sapatos eram apenas utilizados no caminho de e para o campo; nos braços, manguitos, de cotim ou de restos de meias velhas.
Trajo do homem do campo: usava barrete ou chapéu consoante a estação do ano, no inverno barrete, no verão chapéu, nem todos seguiam esta linha pois alguns só usavam uma peça todo o ano; camisa de algodão escura para não se notar o pó e o sujo, por cima uma camisa de riscado; colete e calças de cotim; ceroula atada em baixo e calças por cima arregaçadas, quando o trabalho era mais agreste despia-se as calças e ficava-se só com as ceroulas; os tamancos serviam só para as deslocações para o trabalho e deste para casa, mas a maioria andava descalça todo o ano, à excepção quando iam à vila.
O homem do campo andava sempre com a roupa e aconchegos preparados para as adversidades do trabalho ou do tempo, o lenço de assoar grande e de cor vermelho, servia também para pôr em redor do pescoço para não entrar pó, ou tapar o nariz e a boca, quando andavam nas eiras; a manta lobeira (ou cobertor de papas) serviam para o homem se resguardar das intempéries, frio, chuva, etc.
Imagens: Rancho Folclórico "Os Camponeses da Raposa" - Almeirim
Confesso que gostei tanto do que vi e ouvi, que me apeteceu homenagear esse grupo e essa cidade falando de um dos seus trajes mais simbólicos – o Descarregador de Peixe.
Tentei encontrar uma descrição deste traje mas não consegui, pelo que a exposição seguinte resulta apenas da minha observação, se algum dos leitores pretender acrescentar algo agradeço.
O traje do descarregador de peixe é composto por umas calças curtas e um casaco de cotim, veste ainda uma camisa de riscado. Na cabeça usa o seu principal instrumento de trabalho e o objecto que marca a sua actividade, um chapéu metálico de forma circular, com aba larga e profunda, sobre o qual transporta as canastras de pescado. Para proteger a cabeça da rigidez do metal, utiliza um lenço que amarra na nuca.
Anda descalço, pois a actividade assim o obrigam.
Noutras regiões e em actividades idênticas, havia o costume do peixe que caísse nestes chapéus reverteria a favor do descarregador, daí o andar bamboleante que adoptavam, não sei se é esse o caso, mas gostava de conhecer mais.