Por Carlos Gomes
O concelho
de Olivença é originariamente uma terra alentejana, com os seus usos e costumes
característicos do Alto Alentejo,
o seu modo de falar a Língua portuguesa com a pronúncia característica das
gentes daquela região e o seu património histórico e artístico a atestar a sua
secular portugalidade firmada desde o Tratado de Alcanizes. Porém, a conjuntura
política dos finais do século XVII levaram à sua ocupação militar por parte de
Espanha por ocasião da chamada “guerra das laranjas”, ocorrida em 1801.
Esta situação levou ainda ao desmembramento do concelho de Juromenha uma vez
que, também a Aldeia da Ribeira – atual freguesia de Vila Real – passou a
integrar o município oliventino como se do seu termo fizesse parte.
A partir de
então, diversos sucessos ocorridos ao longo de mais de dois séculos de
ocupação, entre os quais se destaca a guerra civil espanhola e a ditadura franquista,
determinaram a alteração do equilíbrio demográfico, registando-se um
progressivo abandono por parte dos oliventinos de origem portuguesa e a sua
substituição por gentes oriundas da Extremadura e outras regiões de Espanha. A
maioria dos que ficaram foram reduzidos à situação de pobreza, fixaram-se nas
aldeias em redor e foram sujeitos a um processo de assimilação, vendo os seus
próprios nomes de batismo convertidos para o castelhano.
A realidade,
porém, é que tendo a realidade social sido alterada e colocando de parte
julgamentos de natureza política, Olivença acusa presentemente uma forte
influência da extremenha a par de uma surpreendente resistência da cultura
portuguesa. É que, manter viva a chama da cultura portuguesa através de uma
dezena de gerações que viveram sob as circunstâncias mais difíceis, sem
qualquer estímulo por parte do Estado português para além da manutenção
jurídica da questão territorial como uma posição de princípio, convenhamos que
não é tarefa fácil. Pelo que, certos juízos de valor que por vezes se fazem
acerca da vontade dos oliventinos, sem discriminação sequer quanto à sua
origem, só podem ser entendidos como cínicos ou ridículos.
Essa
influência extremenha revela-se nomeadamente através do próprio folclore, sendo
usual os grupos folclóricos e de música tradicional interpretarem danças e
cantares que claramente se distinguem quanto à sua origem e, na realidade, nem
sequer se confundem. Danças como
“O Pescador” e o “Verde-gaio” são representadas a par de jotas
e coplas extremenhas. É uma realidade diferente que é resultado de
processos históricos em relação aos quais não podemos culpar aqueles
oliventinos cujas origens não se filiam na nação portuguesa. Mas, aquilo que
devemos fazer e encontra-se ao nosso alcance é o estreitamento das relações
culturais com Olivença, nomeadamente através do intercâmbio com os grupos
folclóricos e de música tradicional ali existentes, aceitando e compreendendo
as diferenças e relevando a sua identidade portuguesa e as suas características
alentejanas.
Em tempos, o
Rancho Folclórico “La Encina”, interpretava uma cantiga muito popular em
Olivença nos começos do século XX, marcadamente portuguesa. Recolhida por
Bonifácio Gil e publicada no seu “Cancioneiro Popular da Extremadura”, trata-se
de uma melodia melancólica cujo tema sugere a aproximação geográfica ao rio
Guadiana, relacionada com a faina da pesca e com toda a probabilidade
originária da antiga Aldeia da Ribeira, atual freguesia de Vila Real.
O tema, que
possui curiosas semelhanças com outras cantigas do cancioneiro popular
português, trata das relações amorosas do pescador com uma mulher casada, qual
“sereia que canta bela e que perdido é remo e vela”…e os conselhos da
gente para que volte atrás nos seus propósitos. Na realidade, uma versão diferenciada
da cantiga do “pescador da barca bela”!
Ó pescador da barquinhaVolta atrás que vais perdido
Essa mulher que tu amas
É casada e tem marido;
Casada e marido tem,
Ó pescador da barquinha
Volta atrás que não vás bem.
Fugiste-me ingrato
Deixaste-me só
No alto da serra
Sem pena nem dó
Imagens: Museo Etnográfico González Santana (Olivença)
Fonte: Folclore de Portugal
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