segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Trajo Feminino – Glória do Ribatejo

Como já foi referido em Trajes de Glória do Ribatejo, esta povoação é reconhecida pela singularidade dos seus trajos e no empenho das suas raparigas na decoração das suas peças de vestuário, talhado em tecido simples mas de grande riqueza decorativa.
As peças que agora descrevo pertencem à colecção do Museu de Arte Popular e são exemplificativas dessa originalidade desta população.

Casaco – de tecido de algodão cor-de-rosa, bordado a ponto cruz com fio de algodão azul e verde; renda de cochet executada com fio de algodão azul; botões de massa azul.
Decote e gola redonda; as frentes decoradas com motivos florais, renda aplicada sugerindo cabeção e peitilho, ajustadas com 5 botões. As mangas são compridas e fecham com punho e botão. Sobre a cintura, cinto do mesmo tecido ajustado com mola e colchete.

Avental – tecido de algodão verde-claro, bordado a ponto de cruz com fios policromados. De forma rectangular, franzido na cintura com cós e tiras para apertar nas costas; na frente aplicação de bolsos laterais. Na orla da peça, sobre as algibeiras e extremidades das tiras, rosas bordadas.

Taleigo (saco) – de tecido de algodão azul-claro, bordado a ponto de cruz formando motivos florais; renda de crochet em fio de algodão vermelho. Tem forma rectangular, apertando na parte superior com fita de nastro enfeitada com borlas vermelhas iguais às que decoram as extremidades inferiores. Ambos os lados são decorados com bordados e a legenda “Não te Quero” sobre uma delas. Toda a peça apresenta a orla bordada e rematada com renda.

Fonte: O Ponto de Cruz – a grande encruzilhada do imaginário – Museu de Arte Popular – 1998

quinta-feira, fevereiro 11, 2010

Algibeira - Minho

O termo Algibeira é proveniente do árabe e permaneceu no trajo popular feminino de quase todas as regiões do país como uma peça interior, escondida dos olhares estranhos, tal como sucede no Algarve, onde são conhecidas por patronas.
Atadas à cintura, escondidas entre a saia de fora e a anágua, sempre que necessário a mão passava através da abertura disfarçada entre as pregas da saia.
No trajo erudito também é conhecido o seu uso. Durante séculos, os tecidos pesados e opacos ocultavam completamente a abertura da saia, que permitia o acesso a esta bolsa. Com as alterações introduzidas na moda durante o período do império (sec.XVIII), as alterações do corte dos vestidos, com cintura alta, e o uso generalizado de tecidos transparentes e leves, torna-se difícil o uso desta peça. Surgem as bolsas suspensas dos cintos ou dos ombros, em tecidos coloridos, bordados e posteriormente com armação em metal, conduzindo ao aparecimento das bolsas de mão.
No Minho vemos que a algibeira se insere tanto no trajo popular como erudito, tendo-se verificado a passagem de uma peça interior para um acessório externo, exibido para ser admirado com o restante trajo.
Nesta região assume uma forma curiosa, um coração estilizado, adaptando-se perfeitamente aos diversos tipos de trajo da região.

Os exemplares apresentados correspondem a algibeiras do trajo de trabalho e domingueiro, já que nas versões mais ricas e garridas o ponto cruz é menos utilizado, sendo substituído por aplicações de fitas, galões e pelo brilho das lantejoulas, das missangas e dos vidrilhos.
Na sua confecção é utilizado um molde de papel que se aplica sobre os retalhos de tecido pretendidos.
Depois de cosidos, eram decorados com a aplicação de fitas, de bordados e botões, de acordo com a inspiração e os materiais disponíveis. Para o forro era utilizado outro retalho de linho ou riscado.
A função da algibeira, que era usada presa com fitas sobre o lado direito, escondida entre a saia e o avental, é ao mesmo tempo decorativo e funcional.
Nele se guarda o lenço, o terço no segredo (pequena abertura escondida sob a pala), ou os poucos vinténs resultantes da vendo do produto da terra.
No trajo erudito este acessório passou a estar exposto aos olhares de todos. Perdeu a sua simplicidade inicial, para se afirmar pelo exotismo da forma, a riqueza dos materiais e pela exuberância da decoração.

Fonte: O Ponto de Cruz – a grande encruzilhada do imaginário – Museu de Arte Popular – 1998

segunda-feira, fevereiro 08, 2010

Camisa do noivo – Guimarães – Minho

A camisa do noivo pertence a um traje de excepção. Confeccionada propositadamente para uma ocasião especial – o casamento – muitas vezes pelas mãos das próprias noivas, nesta peça está bem presente o cuidado, o carinho e o empenho no modo como foi talhada e bordada.
Como trajo de cerimónia por excelência, esta camisa acompanhou o seu proprietário ao longo da vida, apenas vestida em ocasiões especiais e tê-lo-ia acompanhado na mortalha, o que não ocorreu se por qualquer razão do acaso.


Esta camisa foi confeccionada em estopa de linho branco, bordado a ponto de Guimarães a branco e a ponto cruz com fio de algodão vermelho, formando legenda enquadrada por moldura de motivos florais e enrolamentos.
De corte tradicional, apresenta sobre a gola, ombros e todo o peitilho bordados a branco, cujos pontos ficaram conhecidos pelo nome de “crivo”, “nó”, “mercões”, “favos” e “canutilhos”. Sob o peitilho a legenda AMIZADE em ponto cruz.
A.L. de Carvalho, in Os Mestres de Guimarães, sobre a camisa de linho do lavrador de Guimarães escreve:
“…Quem lhe teceu o pano e costurou, a bordou, foram as obreiras rurais, que vivem paredes-meias com o lavrador.
O peito, o colarinho, as ombreiras, são bordadas a branco. Só a carcela é bordada a vermelho. Pontos: “mercões” e “favos”.
Esta camisa é o luxinho do lavrador, quando aparelhada com a jaqueta de alamares de prata, guarnecida a sutache e fita preta.
Tão rica – que nem a camisa da lavradeira lhe chega!”

Fonte: O Ponto de Cruz – a grande encruzilhada do imaginário – Museu de Arte Popular – 1998

sábado, fevereiro 06, 2010

Saloias do Espírito Santo - Ilha da Madeira

A devoção ao Espírito Santo na piedade popular madeirense enraíza na mesma descoberta da ilha em 1420, e no início do povoamento, por meados de 1425.
As manifestações exteriores de devoção ao Espírito Santo de maior expressão, são as «Visitas Pascais» ou vulgarmente denominadas «Visitas do Espírito Santo», que chegaram até aos nossos dias. Elas realizam-se entre o II Domingo da Páscoa e a solenidade da Ascensão. Entre os seus objectivos, está uma recolha de fundos para a Festa do Espírito Santo, para o «Bodo» ou a «Copa», para ajuda aos mais carenciados, ou para a fábrica da igreja, uma visita e bênção às famílias, levando até elas a presença da Páscoa.
Para o povo madeirense em geral, esta visita constitui uma verdadeira «Festa», pois reúne-se toda a família, para receber «O Espírito Santo», que vem abençoar a casa, a família. Os familiares mais chegados vêm de longe, convidam amigos e vizinhos, e todos podem participar da «Festa»: refeição melhorada, bolos, doces, bebidas licorosas, etc. Respira-se, normalmente, um espírito de fé, pois a visita é recebida com muito respeito e muita dignidade, e as ofertas costumam ser substanciais.


A Visita Pascal é, normalmente, presidida pelo Pároco, acompanhado por pessoas, homens ou mulheres, vestidos com opas vermelhas. Uma leva a Bandeira e outra o pendão com as Insígnias do Espírito Santo, que são beijadas pelos visitados, e ainda outra leva a bandeja ou «coroa» onde são depositadas as ofertas. Por vezes também ainda vai o ceptro, reminiscências das primeiras iniciativas que aproveitavam a Festa do Pentecostes, para demonstrar que o Espírito Santo é, de facto, o «Pai dos Pobres». Normalmente também vão duas «saloias», trajando de vermelho ou o traje típico regional, todas enfeitadas de ouro, as quais vão cantando os versos tradicionais do Espírito Santo. Podem ir ainda um ou dois tocadores de instrumentos regionais, sobretudo «Braguinha» e «Machete”, os quais podem ou não ser remunerados.

Entre os "cantares das saloias" encontramos alguns versos como os seguintes:

O Divino Espírito Santo
Nesta casa vai entrar
Mandado do Pai Eterno
Pra família abençoar.

Vinde Pai dos pobrezinhos
Esta família abençoai
A grandes e pequeninos
Vossas graças derramai.

As saloias trajavam e trajam, ainda hoje, vestido branco de linho, com botões de ouro no colarinho, manga curta franzida e saia também franzida.
Habitualmente o vestido é ornamentado com colares de ouro e folhas de alegra-campo verde. Sobre o cabelo trançado coloca-se uma carapuça enfeitada com colares e prendas de ouro.
Para completar o conjunto, bota chã e rica capa vermelha ornada de flores (perpétua amarela) e muitas prendas de ouro.

Artigos relacionados:
Trajes da Ilha da Madeira, Barrete de Orelhas, Carapuça, Técnica dos Bordados da Ilha da Madeira e História do Bordado da Ilha da Madeira